Uns & Outros Poemas 1985 – 2005

Uns e outros é uma poesia refinada e bem construída saída das mãos de quem absorveu de todas as tradições e sabe produzir o milagre da concisão, marca essencial de toda boa poesia.

“Fui leitora dos primeiros encontros nacionais de haikai, nos idos de 80, que conheci Rodolfo. Um jeito limítrofe do mais tranquilo de chegar. Poucos poemas e um haikai apenas.

Gostei da leveza, do senso de humor, da pequena medalha identificada ao seu lado poeta. Sabe, como atleta, que nunca abraçasse do seu lado prático, fiquei torcendo para que esse tempo não o afastasse da sua prática. Soube, com alívio, muito tempo depois de anos sem notícias, que esse livro existia. E gira.

E mais, ainda quando pude lê-lo, o que há de ver, é que a poesia permanece inteira e a poesia expandiria.

Agora, neste prontuário, estimo aqui, balançando como brinco na orelha, por não saber como se faz para ser imparcial quando a gente se identifica. Lendo mais, atenta, também percebo que muitos mais se identificaram. Essa é uma poesia que brinca de trazer à tona muitas das telefontes, influências, fontes de víveres que pintam, bordam e transbordam neste Uns & Outros.

Uns como a perífrase de reter a ideia da Odisseia, reiventando Homero via Joyce e atritando nas vias pop do século XXI. Outros ao mesmo tempo, como com traços do Modernismo ao pós-moderno, lembrando a poesia caligrama de Edgar Braga e tocando, na musicalidade de Chico e Caetano. E uns outros à moda de Pessoa, Drummond, Pedro Xisto, Bandeira, Millôr, Leminski. Uma poesia que anuncia e nomeia suas escolhas.

Da aprendizagem do haikai tira, além da concisão, a capacidade de saborear cenas do cotidiano, absorvendo sua beleza através do humor, se liberta do silêncio, das grandes questões que ainda assim permeiam cada poema. Um haikai com o coração.

Um Zen que, mesmo sem mão ou martelo, ensina muita coisa. E que o haikai ensina mais que reverências, evitam ser vis. Inclusive nas homenagens, descontruídas ou tradicionais, segue mais as regras tradicionais dos haikais à Bashô ou Sokan. Sem seguir as regras tradicionais, mas que, ainda assim, mantêm o (prestígio do haijin) sabor da migalha, mas que, ainda assim, preserva o espírito livre de qualquer haijin.

Haikai. Até no especular “de tudo que faço vivo um pouco do contrário…”, que não se pretende haikai, mas preserva o seu espírito, onde a concentração da poesia acaba ficando entre os parênteses reveladores de que perder ou ganhar é a mesma coisa.

De tudo um pouco e, ao mesmo tempo, nada disso.

A tessitura do texto, denunciada em “ordiri” (ainda a Odisseia, mas aqui é Penélope que, impronunciável, se pronuncia), alinhava fios vários mas com cores tão absolutamente pessoais e próprias que se torna outro, um outro fio. Entre o algodão de várias leituras e a seda da liberdade criativa, as linhas, na poesia, viram linho.

Mas nada do que se diga sobre essas tramas dirá mais que o “antimanifesto” simples e revelador de sua ética/estética.

O que o poeta deseja é a realeza do plebeu, dizer o não dito, a liberdade dos movimentos e, como sonha o bom poema, abraçar a humanidade.

E eis aqui, em suas mãos, um desejo que se realiza.”

 

Alice Ruiz